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21.4.11

Inflação vs. Taxa de Juros: Onde vamos parar?

Na véspera do feriado da semana santa, o Banco Central do Brasil, em reunião do COPOM, decidiu aumentar a taxa básica de juros da economia (Taxa SELIC) em 0,25 pontos percentuais, elevando-a para 12% ao ano.

A justificativa é que "considerando o balanço de riscos para a inflação, o ritmo ainda incerto de moderação da atividade doméstica, bem como a complexidade que ora envolve o ambiente internacional, o Comitê entende que, neste momento, a implementação de ajustes das condições monetárias por um período suficientemente prolongado é a estratégia mais adequada para garantir a convergência da inflação para a meta em 2012."

A inflação. O relatório Focus (realizado pelo próprio BC) do último dia 15/04 mostra que o mercado acredita que o nível de preços da economia só tende a subir. E isso se confirma nos resultados do IPCA, divulgados pelo IBGE. Segundo publicação do dia 07/04, a variação média de preços em março foi praticamente a mesma do mês anterior. Comparando com o mesmo período de 2010, houve um crescimento de mais de 50%!

Outro ponto a se destacar é que, apesar dos esforços recentes do Governo para controlar a inflação, a expectativa do mercado em relação à inflação continua a crescer. É verdade que a previsão para a inflação de 2012 é inferior a deste ano... mas o que se observa é uma tendência ascendente nos valores esperados.

O cenário interno. Aqui, temos um tripé formado pelos gastos do setor público, pelas despesas das famílias e pelo investimento. O primeiro não cabe às autoridades definir. O consumo das famílias, como vem sendo discutido desde 2010, é um dos componentes que segurou o crescimento brasileiro durante a crise de 2008. Entretanto, este consumo cresceu a tal ponto que está desestabilizando a economia... há mais pessoas querendo comprar que disponibilidade de produtos. Os grandes responsáveis foram a própria crise externa, por afetar a percepção e as expectativas nacionais, o barateamento do crédito à pessoa física (classe média) e a constante valorização real do salário-mínimo (classes D e E). E, por fim, o investimento... com a fuga de capitais entre 2008-09, o investimento nacional não avançou, deixando a oferta nacional de bens e serviços  do mesmo tamanho, apesar da demanda estar sempre crescendo, contribuindo para a trajetória crescente da inflação.

O dólar. Como dito anteriormente, a crise internacional recente foi caracterizada, no Brasil, pela fuga de capitais (nacionais e estrangeiros) para os EUA. Pode parecer contraditório, mas dada a situação, para os detentores de capitais, o país mais seguro para aplicarem suas reservas era aquele que iniciou todo o desastre! Mas passado o choque inicial, e frente ao bom desempenho do sistema financeiro brasileiro apesar da crise, o fluxo de capitais externos (não só dos EUA) se intensificou bastante pelas diversas vias, como compra de títulos do governo, ações de estatais, investimento direto e captação por parte dos bancos nacionais de recursos mais baratos*.

Somado a isso, durante o período da crise, o Brasil deveria ter sofrido uma forte desvalorização do Real, contudo, o BC utilizou de suas reservas de dólares "públicos" para manter uma taxa de câmbio aceitável, o que tornou o Brasil um país ainda mais atrativo como "porto seguro".

As consequências de nossa boa performance estão visíveis desde o segundo semestre do ano anterior, quando se começou a elevar as alíquotas do IOF - imposto que incide sobre as operações financeiras - para transações externas. Isto é, há muito capital disponível no Brasil, o que pressiona a demanda por bens, serviços e ativos de forma geral. Isso, por conseguinte, pressiona a inflação para cima.

COMENTÁRIOS
As autoridades monetária e fiscal estão subestimando o mercado. Esta é a minha visão dos acontecimentos recentes. Mudanças pequenas e já incorporadas à percepção dos agentes de nada adiantarão para alterar o quadro em que a economia brasileira se encontra. Até agora, as medidas de reforço macroprudenciais foram as únicas que podem vir a servir como um colchão, mas dada a magnitude dos efeitos da inflação, da taxa de juros e da taxa de desemprego vigentes, esse amortecedor não surtirá efeito.

Na minha visão do Brasil, eu sugeriria uma política mais discricionária, isto é, focalizando em cada setor específico determina ação. No caso dos juros, não acredito que a elevação da Selic e, consequentemente, das taxas de juros cobradas em empréstimos e financiamentos, vá limitar a expansão da demanda (consumista) interna. O boom do consumo das famílias está concentrado na dita "nova classe média", onde o crediário (seja por cartão de crédito, cheques ou carnê das lojas) é a principal fonte de "renda". Para essas famílias, e para aquelas que ainda estão chegando nessa classe, não importa quanto de juros está sendo pago, o que vale é se a parcela cabe no orçamento. Se antes o financiamento era em 5 ou 6 meses, agora as famílias ficarão endividadas por um período mais longo, de 10 a 12 meses, por exemplo.

Como comentei lá em cima no "cenário interno", o problema é como atender a essa demanda antes reprimida, mas que agora cria um ambiente inflacionário! O Investimento, apesar de ser considerado parte da "demanda agregada", é a solução para a expansão da oferta e, segundo a teoria econômica, para o desenvolvimento sustentado da economia. A questão é que o investimento é muito, mas muito mais sensível à taxa de juros, e essa política de gradual elevação da Selic vai minando a possibilidade de mais investimentos, perpetuando a pressão inflacionária do lado da demanda das famílias.

O real valorizado de certo prejuducará às exportações e, no sentido contrário, favorecerá às importações. Por um lado, teríamos um aumento, mesmo que temporário, na oferta interna provocado pela entrada de produtos importados e pelo "desvio" de parcela daquilo que seria exportado. E isso poderia nos ajudar a reduzir o impacto da inflação. Uma moeda forte também possibilitaria as indústrias importarem bens de capital e se financiarem externamente, lembrando que as taxas de juros externas encontram-se abaixo do equilíbrio. No médio prazo, as forças do próprio mercado se encarregariam de encontrar um ponto ótimo na balança comercial (caso contrário, o governo possui as armas necessárias para contornar o déficit comercial).

Então... o que fazer? Acredito que uma política "curta e grossa" seria mais eficiente e eficaz no combate aos males que aflinge ao Brasil. Medidas "nas pontas" (voltadas para cada público específico) são minhas opções.

Afinal, como as coisas estão sendo levadas, parece que o responsável pelas políticas "anticíclicas" é o próprio mercado.

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* Este último canal vale uma maior atenção. A falta de solvência internacional gerada pela crise fez com que os países em geral reduzissem suas taxas de juros a níveis ínfimos, de modo que a remuneração dos capitais fosse baixíssima. Nesse cenário, o Brasil tornou-se (mais uma vez) o país com a maior taxa de juros real do planeta! Só que, dessa vez, com aspectos macroeconômicos mais consolidados e reconhecidos mundialmente. Assim, os bancos sediados no Brasil puderam captar recursos pagando baixas taxas de juros e emprestá-los - ou apenas aplicá-los - a uma taxa muito superior, elevando o já elevado spread bancário. E isso, per se, leva a arbitragem dos demais agentes econômicos.

4 comentários:

  1. Realmente, concordo. Sempre me perguntei se a alta nos juros de fato conseguia frear o consumo intenso das famílias, e lendo teu post percebi que não surte tanto efeito mesmo. O negócio, na minha humilde opinião (eta frase clichê!), é o foco na oferta. Criando um ambiente favorável para a sua expansão você promove crescimento, real, e ainda anula o aumento de preço provocado pela demanda. Como isso? Um sistema tributário menos complicado, melhorias de infraestrutura, enfim, incentivos ao investimento, como você falou.

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  2. E está mais do que na hora, né? A COPA já está batendo na porta do Brasil e o investimento necessário para aproveitarmos seu "incentivo potencial" até agora não deu as caras.

    O Brasil não está em um modelo de economia fechada. Se não dá pra resolver sozinho, que se exporte o problema! xP

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  3. Esse é o mal de se apoiar em política de curto prazo, de "arranjo nas pontas". Boa parte dos problemas econômicos que a gente tem são estruturais mesmo. Já passou da hora do Brasil olhar pra frente e pensar em uma política econômica com resultados duradouros.

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  4. Olá Ikari! Parabéns pelo texto! Panorama muito bem traçado. O argumento do Mantega de que a nossa inflação é exclusivamente importada é falso, a inflação é sim hoje um grande e crescente problema em economias emergentes e tem causas internas estruturais também. O problema é que ela tem vindo combinada da armadilha de liquidez em economias avançadas com a pouca disposição dos emergentes de permitirem a valorização de suas moedas.
    Abraço,
    Adriano.

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